Para Ives Gandra, ICMS criou uma “federação de inimigos”

O jurista Ives Gandra Martins afirmou que o ICMS é um fator de desagregação da federação brasileira, por favorecer a guerra fiscal e colocar os Estados uns contra os outros.

Numa reforma tributária, afirmou defender “uma solução radicalíssima”, com dois únicos tópicos. Seria a proibição de incentivo fiscal com o ICMS e a instituição de uma alíquota única para todo o país.

Ives Gandra foi um dos palestrantes, nesta terça-feira (07/03), do segundo e último dia do Fórum Reforma Brasil, promovido pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP).

O encontro foi também promovido  pela Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp), com apoio do Instituto Panthéon Jurídico, do Sescon-SP, que cedeu seu auditório para os trabalhos, e ainda do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e da Fecomercio-SP.

Gandra argumentou que uma reforma tributária deveria se acoplar a uma reforma administrativa, para racionalizar e tornar mais leve a máquina oficial.

Enquanto no Brasil a carga tributária é de 35%, nos Estados Unidos e na Coreia do Sul ela é de 24%, e, no México, de 19%.

O ICMS, nesse ponto, é uma espécie de “nó górdio”, que, por meio dos incentivos fiscais, transforma o Brasil “numa federação de inimigos”. Uma reforma tributária, disse ele, também precisaria simplificar a legislação.

Na agenda política, Gandra disse esperar que o governo do presidente Michel Temer se beneficie de estabilidade para levar a bom termo a agenda de reformas que já vem implantando.

Um dos fatores que conspiram contra a estabilidade é o processo que corre no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pode, em tese, cassar o mandato do presidente.

O jurista revelou que está preparando um documento a ser entregue aos advogados de Michel Temer, que argumenta ser possível e até mesmo inevitável a separação dos orçamentos de campanha da chapa encabeçada por Dilma Rousseff, em 2014.

Ou seja, Temer não é responsável pelos crimes de suborno e caixa dois que a Lava Jato e as investigações do TSE desvendam na campanha do Partido dos Trabalhadores.

Gandra diz que já existe doutrina para separar os orçamentos e a imputabilidade das duas campanhas.

Tratam-se de decisões judiciais sobre coligações para cargos proporcionais, em que, por exemplo, crimes eleitorais que levem à cassação de vereadores não contaminam, na mesma coligação, o mandato de deputados.

Gandra também se referiu ao projeto de reforma política, que ele e um grupo de especialistas está elaborando em nome da OAB-São Paulo e da Fecomercio.

A proposta inovadora estaria na instituição do parlamentarismo, mas não nos termos do plebiscito de 1993, em que o sistema de governo foi rejeitado, porque o projeto de então previa a eleição indireta do presidente da República.

O plano é agora manter a eleição direta para o cargo, mas com a paralela criação de um chefe de governo, que seria responsável pela gestão do Estado.

A seu ver, a proposta é particularmente necessária, porque o Brasil se assemelha hoje a um doente enfermo que estará deixando a UTI no final de 2018.

O clima, diz ele, é propício para a aparição de “salvadores da pátria”, com ideias demagógicas e desestabilizadoras.

OS 28 ANOS DE CONSTITUIÇÃO

O ex-senador e ex-governador gaúcho Pedro Simon, segundo orador do Fórum Reforma Brasil, afirmou que só nos últimos três anos, com a Lava Jato, é que os instrumentos criados pela Constituição de 1988 tendem a pôr fim à ideia de que o Brasil era o país da impunidade.

“Pela primeira vez as coisas estão acontecendo”, disse ele, não apenas por meio da descoberta de crimes, mas também pela punição dos envolvidos. “O presidente da maior empreiteira do país está na cadeia!”

Sobre o biênio propriamente dito de elaboração do texto constitucional, Simon disse que tudo ocorreu sob a égide de um governo fraco, o de José Sarney, que não dispunha do capital político de Tancredo Neves, de quem foi apenas o vice. Tancredo morreu antes de tomar posse.

Sarney pouco arbitrou em questões levantadas pelos constituintes. E estes, na falta de consenso, apenas mencionavam questões – reforma agrária, fidelidade partidária, reforma tributária – e remetiam comodamente, no texto constitucional, a leis complementares que nunca chegaram a ser discutidas nos anos seguintes.

BRASIL É UM PAÍS MAIS LIVRE

Outro orador foi o professor Fernando Facury Scaff (Faculdade de Direito-USP), para quem, entre os grandes acertos da Constituição de 1988, estão as amplas liberdades públicas e a busca da diminuição das desigualdades, o que não deixa de ser uma maneira de incluir no mercado parcelas da população antes submetidas à extrema pobreza.

Quanto aos erros, especial ênfase no ICMS (ampliação do antigo ICM), que “acabou virando um monstro”, pelo fato de representar “uma tributação subnacional” (decidida pelos Estados), tornando-se uma espécie de IVA (Imposto sobre o Valor Agregado) de muitos países europeus, mas de âmbito estadual.

O ICMS também foi abordado pelo último palestrante do fórum, o economista Bernard Appy. Ele resumiu as sugestões de reforma tributária, elaboradas pelo Centro de Cidadania Fiscal, do qual faz parte.

O atual sistema tributário brasileiro, disse Appy, tem como características básicas a elevada litigiosidade, a complexidade, e as distorções alocativas (que estimula a perda da produtividade).

Um exemplo que explica esse último aspecto. A construção civil em concreto, cimento e tijolos paga bem menos impostos que as edificações feitas com estruturas metálicas, preparadas por indústrias especializadas.

Por uma questão de custos derivados de fator tributário, as estruturas metálicas são bem menos utilizadas, embora, se fossem tributadas pelas alíquotas do método concorrente, permitissem construir mais prédios a uma velocidade maior.

Duas últimas características do sistema fiscal brasileiro são, disse ele, a falta de transparência e a existência da guerra fiscal entre Estados.

E é um país com tributos semelhantes, que batem cabeça e complicam a vida das empresas. O que seria equivalente ao IVA europeu existe por aqui sob a forma de quatro tributos: o PIS/Cofins, o IPI, o ICMS e o ISS.

É como exemplo anedótico da irracionalidade. A programação da TV a cabo paga ICMS. Mas a programação do Netflix paga ISS.

Fonte: Siga O Fisco em 08/03/2017

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